Um dia qualquer em Itapema, naquele ano de 1954. Raiava a autonomia do Distrito portuário...
- Lula! Lula, meu fiu... Corre cá! - Lindu nem sabia de onde tirou aquele apelido.
Entretido com o amigo Mauro em fincar uma estaca para fazer o gol e jogarem bola na rua, ele mal ouvia. Nesse dia não havia ido à escola Marcílio Dias. Certeza, D. Cassiana depois lhe passaria um pito daqueles. Por implicância do pai, achando que o filhos só precisavam trabalhar. Também temia, ele chegar do cais e o colocasse pra dentro de casa levando uns tabefes... Lula apoiava e Mauro mandava ver o porrete.
- Cuidado cum esse dedo, menino!
- Cuidado cum esse dedo, menino!
Deu fé... Ele já sabia. Era pra ir ao empório comprar mantimento pra mãe. Certamente naquela noite na janta comeria bolinhos de feijão com farinha, amassados na mão e o caldo de pimenta pra dar gosto na comida, que tanto adorava. Sem falar no mingau de café com farinha... O bom destas idas sempre foi admirar o baleiro giratório, movimentado num impulso.
- Avie!... - Do portão Dona Lindu esperava, vendo Lula arrastando a poeira. Só aqui dera Certidão de Nascimento ao filho. Merecia um descanso, não botando o menino pra mode vender tapioca e banana no Pontão das barcas, que ajudava um pouco no sustento. Ainda assim, milhor do que deixar o pai Aristides mandá-lo pro meio do mangue apanhar com os outros irmãos, mariscos, caranguejos e lenha nas matas do derredor. Até traziam um tal coquinho Ticum.
Vivia receosa das pescarias dele com o irmão Ziza na "chata" do pai pras bandas da Bocaina, encostada a pista donde os aviões avoavam. Garantia a "mistura", mas era perigoso... Deus o livre! Não queria perder mais filhos, acontecido aos gêmeos nascidos de 7 meses.
O marido tinha vindo para cá empregar-se na estiva, mas não fizera as coisas conforme combinado. Recebera uma carta mandando ela vir, porém era tudo invenção do seu filho Jaime que veio antes, desde 1950. O "cabra" ficou desnorteado, fulo de raiva ao descobrir a novidade. Ia largar a família de caso pensado. Decerto queria vida nova na cidade grande... E ela!? Que se virasse com aquela ruma de gente... Danou a beber. Então vivia enjeitando os filhos. Não dava nada pros meninos. Era um custo que comprasse calçado, uma alpercata pra eles... Só lhe procurava fingindo falso querer.
RUA MINAS GERAIS EM ITAPEMA/SP, ONDE MOROU O PRESIDENTE LULA E FAMÍLIA (2011).
O marido tinha vindo para cá empregar-se na estiva, mas não fizera as coisas conforme combinado. Recebera uma carta mandando ela vir, porém era tudo invenção do seu filho Jaime que veio antes, desde 1950. O "cabra" ficou desnorteado, fulo de raiva ao descobrir a novidade. Ia largar a família de caso pensado. Decerto queria vida nova na cidade grande... E ela!? Que se virasse com aquela ruma de gente... Danou a beber. Então vivia enjeitando os filhos. Não dava nada pros meninos. Era um custo que comprasse calçado, uma alpercata pra eles... Só lhe procurava fingindo falso querer.
PONTÃO DAS BARCAS (DÉCADA DE 1950) ITAPEMA/SP - LOCAL ONDE LULA VENDIA TAPIOCA, BANANA ETC.
Nisto apareceu um desses fotógrafos de porta oferecendo um retrato dos filhos. A situação difícil ela não quis.
- Olha que seu filho pode ficar gente importante... E a senhora não vai ter nenhuma fotografia.
- Quero ser jogador de futebol. - Adiantou-se Lula. Sonhando ser craque dos gramados, encantado com as partidas que via no Campo do ITAPEMA F. C., ali perto, sempre de casa cheia.
- Ou muito mais!
- Onde se viu!? Fiu de pobre tem lá importança... Só nos estudos.
- Nunca se sabe.
- Tô pelejando, Seo ...
- Faço preço bom, pronto.
- Num carece. Tem aí um retrato dele cum a irmã Maria. Nóis tirô quando tava cuns treis anos.
- Num carece. Tem aí um retrato dele cum a irmã Maria. Nóis tirô quando tava cuns treis anos.
- Mas ele está crescido. As feições modificam.
- Apôis, donde vô tirá dinhêro... Otro dia foi um turco quereno mi vendê uns lençó... Tô lisa.
- Seu espôso paga, dona.
- Se prestasse vintém... Aristides nem pra sê pai, meu sinhô. - Deixou escapar. Por dentro seu coração contristava-se, tendo descoberto que o marido se enrabichara da prima e feito nela filhos. O disgramado ainda fazia pouco dela, botando Lula pra puxar a pipa d'água praquela sirigaita. Aquilo era bruto. Capaz de esconder uma broa das crianças, dentro da lata, pra comer sozinho por pirraça. Sentia dó, não. Certa vez a filha lhe pediu um naco de pão-doce, e Aristides fez ouvidos moucos, deu para o cachorro ao pé da mesa. Disse que não gostava de menina "chimona".
- Mãe! Não diga assim do pai. - Defendeu Lula, apesar das judiações. - O moço nem conhece nóis.
- Luiz Inácio, tome tento. Ou lhe dô um puxavante de oreia... Vá ligêro na venda! Traga farinha da grossa.
Disposto a convencer Dona Lindu, o homem apanhou uma caderneta.
- Como é mesmo o nome desta rua? - Insistiu o fotógrafo pretendendo fazer cadastro.
- Minas Gerais.
Ele soletrou em voz alta, copiando o número pintado na tábua da casa.
- E o bairro?
- Vila Alice... Oxente moço. Eu nem tô podeno. Já disse! Tô inté pensano ir simbora. Aqui num dá não... Licença, viu! - Era vizinha do marido, num chalé alugado, amancebado cuma outra mulé. Foi o arranjo da safadeza dele... Daí certo dia pegou uma calça descosturada, já gasta sem segurar mais ponto de costura e esfregou no nariz dela. Quis bater. Outra mulher, vá lá. Mas apanhar, não. Contava mudar a sorte.
Dali um pouco a família arredou pé. Aristides quis receber, mais daquilo que dava. Guiados por essa Mãe-coragem seguiu em frente pra Capital, errante como havia começado. Quem podia prever o futuro...
CENA DO FILME 'LULA', O FILHO DO BRASIL' (2010), COM LOCAÇÕES EM ITAPEMA/SP.
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