__________ Itapema, suas histórias... __________

quinta-feira, 1 de maio de 2014

PRESIDENTE LULA NO ITAPEMA/SP

O PRESIDENTE LULA VIVEU POR 4 ANOS DURANTE A INFÂNCIA EM ITAPEMA/SP.

Luiz Inácio "LULA" da Silva, é o sétimo dos 8 filhos de um casal de lavradores que vivenciaram as dificuldades da seca, na zona mais pobre do Estado de Pernambuco, Aristides Inácio da Silva e Eurídice Ferreira de Mello (carinhosamente conhecida como D. Lindu), moradores de Caetés (PE), que à época era Distrito do município de Garanhuns (PE). Nascido no dia 27 de Outubro de 1945, numa humilde casa, com chão de terra batida e dois cômodos. Uma sala e um quarto. As crianças dormiam em redes.
Faltando poucos meses para sua mãe dar à luz a Ele, seu pai decidiu tentar a vida em São Paulo, levando consigo escondida Valdomira Ferreira de Góis ("Mocinha"), prima de Lindu, com quem teve um romance extra-conjugal e no transcurso da história surpreendentemente formaria uma segunda família.

[Eurídice Ferreira de Mello - "D. Lindu"]

Ainda no agreste nordestino, as dores do parto para a esposa Eurídice chegaram dois meses depois. Chamou o cunhado José (irmão mais novo de Aristides), dizendo que o bebê vinha a galope:
"(...)A parteira era muito gorda e eu muito magrinho, ela se agarrava em mim e caímos os dois do cavalo pelo caminho..." - Recorda o tio José, aos 75 anos de idade. - "(...)Quando chegamos, o menino já foi nascendo. Depois, mamou como um bezerro..." - Neste atropelo sertanejo veio ao mundo Luiz Inácio, "Lula". Teve por padrinho o tio José e madrinha sua namorada Lili. - "(...)Uma moça da roça, mas linda demais..."
Residindo em ITAPEMA/SP, Litoral Paulista, Aristides mandava de vez em quando algum dinheiro para o sertão pernambucano, difícil de chegar. Também enviava e recebia notícias através de cartas que seus amigos alfabetizados ajudavam a escrever e entender. Lá no semi-árido a enganada Lindu esperava naquela incerteza, seus filhos inseguros.
ITAPEMA/SP NA MARGEM ESQUERDA DO PORTO [BAIXADA PAULISTA] 1939.

Cinco anos mais tarde (1950), empregado como estivador no Porto de Santos, o pai retornou para visitá-los no nordeste, ocasião inclusive em que apresentou à sua primeira família os filhos tidos com a mulher Valdomira ("Mocinha"). Todavia, sem mencionar nada a respeito do amasiamento. Momento em que também veio a conhecer seu filho Luiz Inácio da Silva ("Lula"). O menino de cinco anos de idade, o vê como uma aparição:
"- Quem é esse homem?..." - Pergunta ao encontrá-lo.

[Aristides Inácio da Silva - pai de "Lula"]

Nesta rápida estada, a espôsa engravidaria então da filha Tiana (Rute). De volta para o Distrito itapemense, na Ilha de Santo Amaro, por insistência de Lindu bastante cabrera, traz consigo o filho Jaime.
Em Dezembro de 1952, quando Lula tinha apenas 7 anos de idade, Eurídice decidiu migrar para o Litoral do Estado de São Paulo com seus filhos a fim de reencontrar o marido estivador. Acreditando que Aristides fizera esse pedido, mas na verdade fora invenção de seu filho Jaime, o qual escreveu dizendo para a mãe ser este o desejo de Aristides, reunir a família. De fato, a carta era do pai, que ditou o texto para o filho escrever. Aristides dizia que estava mandando dinheiro e que Lindu continuasse por lá, cuidando bem de sua gleba de terra. Afirmava ser a vida por aqui muito difícil, embora trabalho não faltasse.
"Meu pai não sabia ler. Eu também não sabia, nem sei até hoje. Essa é a verdade. Mas sabia fazer rascunho. Eu tava apanhando que nem cachorro velho e sozinho. Sofrendo como um condenado. Ele mandava notícias pra mãe, falando em saudade, dizendo que tava tudo bem. Mas era só a carta que tinha saudade, não o pai. Como ele não sabia ler, aproveitei o embalo..." -  Jaime escrevinhou em algumas linhas diferente das ordens de Aristides:
"Lindu,
vende tudo e vem pra cá viver comigo. A vida aqui é melhor. Estou te esperando. Aristides." - Mas isto o filho não leu. O pai pediu para ver a carta. E a olhou com cuidado. Porém, era cego para o alfabeto.
Ou em outras palavras, do jeito que conta Jaime:
"(...)Vocês vão morrer de fome aí. Vendam tudo e venham para cá."
Genival Inácio da Silva, o Vavá, um dos irmãos, recorda daquele momento:
"(...)A mãe vendeu terreno e casa, uma meia-água, três quartos..." - Vendeu ainda uma cabra da família. Largou o cachorro de estimação, Lobo, que uivou nos dois dias de espera do "pau-de-arara", pressentindo a partida. Quando o caminhão finalmente chegou, trazia alguns retirantes de outros sertões. A bodega do Tozinho estava agitada. Parentes dos que iam se abraçavam, choravam um último adeus. No meio da agitação, Luiz Inácio viu uma coisa mágica: um homem equilibrava-se sobre duas rodas. Ficou paralisado, sorrindo, Lula tinha descoberto a bicicleta. E nem sabia quantas máquinas, invenções, ainda veria. 
Após treze dias de viagem num transporte conhecido como "pau-de-arara" (um caminhão carregado de gente na carroceria) desceram num lugar do Bairro do Brás, na Capital Paulista.
"(...)O pau-de-arara parava nos postos de gasolina pra gente dormir, pra comer farofa. Os porcos vinham roubar a comida da gente a noite. Era só poeira..." - Lembra Vavá da viagem dificultosa, o caminhão apinhado de retirantes e seus parcos pertences.
Tomaram um táxi, descendo a Via Anchieta (recém inaugurada) até a Baixada Paulista, no Porto de Santos, onde chegaram ao ITAPEMA/SP, na Ilha de Santo Amaro.
"(...)Eu só me lembro da gente na porta do balcão do Porto de Santos. E da frustração da minha mãe..." - Recorda Luiz Inácio.
ITAPEMA/SP ÀS MARGENS DA ILHA DE SANTO AMARO [DÉCADA DE 1960].

Dentro da Barca, Lula e seus irmãos, sujos e descabelados, seguravam em suas trouxas com roupas gastas, fotos de famílias e coisas mínimas. Lindu carrega o maior patrimônio estimado, os filhos tidos com Aristides, acreditava que sua vida recomeçaria naquele instante... Para alguém acostumado a ver pequenas quantidades de água, deslizar entre navios enormes parecia coisa de outro mundo. Logo, a Barca atracaria, num reencontro com o marido... Quando desceram da embarcação, conseguiram informações sobre Aristides. Ele estava próximo, e alguém foi avisá-lo de que sua família havia chegado. Aristides contrariou-se... "Só me faltava essa!" Chamou Jaime, que descansava recostado num canto. Os dois saíram rapidamente. Em frente a um bar, Eurídice e seus filhos esperavam ansiosos. Mas, seus sorrisos se dissolveram quando olharam nos olhos de Aristides. Viram neles a cor da raiva. A boca contraída de indignação.
O MENINO LUIZ INÁCIO "LULA" DA SILVA E A IRMÃ MARIA [1948].

"(...)Ele [Jaime] escreveu para nós em 1952. Foi coisa dele dizer para a mãe que era pra vender tudo e vir embora para São Paulo. O pai não estava nos esperando. A reação dele foi braba..." - Comenta José Ferreira, apelidado "Ziza" (hoje Frei Chico).
"(...)O pai não sabia que eu tinha escrito e estranhou quando chegaram aqui. Chegou a turma toda, eu não conhecia mais ninguém. Ele ficou macho... Tava morando com a outra, não sabia o que fazer..." - Aristides nunca soube quem os tinha chamado, conta Jaime.
Noutro depoimento à jornalista Denise Paraná acrescenta Vavá:
"(...)Chegamos em São Paulo e andamos pela primeira vez de automóvel. Uma maravilha. Um táxi. Um Chevrolet 51. Era uma alegria a sensação. Descemos no Armazém VIII, fomos atrás do meu pai. Ele era carregador de café. Quando ele nos viu, só não matou a gente porque não pôde. Tinha outra família. E casa pra todo mundo?..." - Cismou então que deveriam ter trazido seu cachorro de estimação ("Lobo"). Mas como?... Deixaram lá o bicho abandonado! Pra ele era preferível ter vindo o cachorro.
"(...)Meu pai não queria que eles viessem..." - Reintera Jaime, que morria de saudade.
Ficara evidente que Aristides pretendia ter uma nova vida na cidade grande, Eurídice e os filhos ao lado atrapalhavam.
Em ITAPEMA/SP, surpresos, tiveram de dividir a companhia de Aristides mais a família formada com Valdomira, sob o mesmo teto, num típico chalé itapemense.
RUA MINAS GERAIS - ONDE "LULA" MOROU COM A FAMÍLIA [ITAPEMA/SP] 2011.

A convivência difícil, motivada pelo marido (extremamente rigoroso com seus filhos), pois era rude, muito bruto, sem nenhum carinho por eles. E diante do inusitado daquela situação do casamento. Levou Eurídice a pedir para sair de casa com a filharada. Aristides passou a morar noutra, vizinha a de Lindu, também na Rua Minas Gerais - Bairro Vila Alice.
"(...)Ficamos um ano e pouco com ele. Levou a família para a outra casa e nós ficamos morando na casa que ele morava. Era muito ignorante. Maltratava muito a gente. Minhas irmãs trabalhavam em casa de família, os mais velhos também trabalhavam. A gente não podia sair de casa, não podia ir à escola..." - Lembra José Ferreira, o "Ziza".
Era uma luta diária sustentar tantas bocas. D. Lindu catava sobras de grãos de café caídos nas calçadas dos armazéns do Porto para vender e completar a renda. Marcaria Luiz Inácio, o fato deles não comerem carne quase nunca.
"(...)A carne que a gente comia era a mortadela, que meu irmão roubava na padaria em que ele trabalhava."
Maria Helena Cerqueira, 56, aposentada (antiga vizinha da rua) conheceu Lula na infância, diz numa reportagem:
"Quem dava comida para eles era minha mãe..." referindo-se a senhora (com certo parentesco) sabedora das necessidades de D. Lindu no cuidado dos filhos.
ANTIGO ENDEREÇO DO PRESIDENTE "LULA" EM ITAPEMA/SP [2005].

Aristides dera para negligenciar a família tida com a primeira mulher. Era o tipo de homem de mandar em casa. Que lhe devessem respeito incondicional. Prepotência das razões. Corrigindo tudo a base de surras, como bem aprova o senso comum. Ter duas, três mulheres conforme lhe aprouvesse. Estúpido no trato familiar, proibia os filhos até de ir ao cinema (nesse tempo o Distrito mantinha dois: Cine-Teatro 'Itapema' e Cine 'Avenida'), além de coisas corriqueiras como jogar bola na rua ou comer uma guloseima sem sua autorização.
"(...)Uma ocasião ele chegou, passou em casa e a gente tava chupando sorvete. Queria saber onde arrumamos dinheiro. Ameaçou a gente. Bateu na minha irmã. Era muito ignorante..." - Fala José Ferreira, guardando alguma mágoa.
"(...)Ele só passava na casa da minha mãe pra ver como as coisas estavam e dormia na casa da outra. Nós trabalhávamos [Jaime empregou-se num estaleiro do Itapema]. Era do trabalho pra casa, não podia fazer nada. E ele sempre ajudou mais a outra família. A gente se virava..." - Diz Jaime, sem compreender o pai.
"(...)Nós não tínhamos vida de criança, não tinha esse negócio de brincar, jogar bola, se divertir..." - Reintera Luiz Inácio num depoimento.
Seus modos ríspidos levavam ao retraimento afetivo das crianças, as quais temiam Aristides. Por dar a entender serem os filhos um estorvo na vida dele.
"Quando estava chegando a hora de meu pai chegar em casa, era uma tortura para todos nós..." - Comenta Lula. - "(...)Meu pai era aquele tipo de pai que o filho não tinha prazer de chegar em casa, porque só batia, gritava, não tinha uma palavra de carinho com a gente..." - Durante uma surra, Ziza apanhou tanto que fez xixi nas calças.
"(...)Minha mãe não tinha opção... (...)Precisava sustentar os filhos e dependia do meu pai." - Pondera Genival Inácio da Silva, o Vavá.
RUA MINAS GERAIS NO BAIRRO VILA ALICE, ONDE VIVEU LUIZ INÁCIO DA SILVA E FAMÍLIA [2011].

A Certidão de Nascimento de Luiz Inácio "LULA" da Silva somente seria lavrada no recém instalado Cartório de Itapema, momento da autonomia administrativa do Distrito.
Durante este período Lula foi alfabetizado no Grupo Escolar 'Marcílio Dias' e teve como professora D. Cassiana. Apesar da falta de incentivo do pai (analfabeto), achando que seus filhos não deveriam ir à escola, mas apenas trabalhar ou só servia para as filhas aprenderem a escrever cartas aos namorados. Entretanto sem saber ler, Aristides sempre comprava o jornal do dia. Lula guarda em suas recordações sobre o pai, esse modo contraditório de ver a vida por Aristides. Contou ele para o jornalista Mário Morel:
"(...)Eu me lembro que minha mãe me colocou na Escola e ele não queria. Xingou minha mãe. E no primeiro dia que eu fui na Escola, quando eu estava chegando, ele estava em pé no portão como se fosse um todo-poderoso, para me dar bronca porque eu tinha ido para a Escola. Eu cheguei meio escondido, atrás de uns pés de cará, com medo de chegar perto dele."
A PERSONALIDADE EXTREMADA DE ARISTIDES INÁCIO DA SILVA  TORNAVA A CONVIVÊNCIA DIFÍCIL COM A FAMÍLIA - CENA DO FILME 'LULA, O FILHO DO BRASIL' [SET DE FILMAGEM ITAPEMA/SP].

Aristides Inácio da Silva deu pra beber com frequência. Descarregar nos filhos suas frustrações. Totalmente insensível aos sentimentos da família, duma crueldade mesmo.
"(...)Meu pai era um homem muito rude. Um dia nós estávamos todos juntos. Meu pai comprou sorvete. Eu nunca tinha chupado um sorvete na minha vida. Meu pai deu um sorvete para cada um dos filhos dele com a outra mulher. Aí sobrou um. Ele esticou para me dar e depois não deu, dizendo que eu não sabia chupar sorvete. Até hoje eu lembro. Isso me marcou muito..." - Revela Lula. - "(...)Era muito ignorante. Levantava cedo, tomava café, comia o pedaço de pão dele. Depois pegava o restante e botava numa lata em cima do armário e ninguém podia comer." - Não poupava nenhum da sua numerosa prole. Certa vez a filha lhe pediu um naco de pão-doce, e Aristides fez ouvidos moucos, deu para o cachorro ao pé da mesa.
Ainda quando morava em ITAPEMA/SP (entre 7 e 11 anos), Luiz Inácio começou a trabalhar contribuindo com a renda familiar. Vendia Laranja, banana, amendoim, tapioca, no cais do Porto santista e na Estação das Barcas, além de ter sido engraxate.
O garoto Lula era meio tímido. Frei Chico, seu irmão, precisava dar-lhe alguns estímulos para ele apregoar:
"(...)Ele tinha vergonha de gritar: "Olha a tapioca!" E as vezes eu dava uns "cascudos"..." - Ri o irmão ao recordar.
Pojucã da Silva Souza, 61 anos (morador itapemense), antigo vizinho, afirma numa entrevista conseguir emprego junto com Lula na extinta Lavanderia e Tinturaria 'Iporanga', existente em Itapema àquela época.
"PONTÃO DAS BARCAS" - LOCAL ONDE LULA VENDIA TAPIOCA, LARANJA E FOI ENGRAXATE [ITAPEMA/SP] ANOS DE 1960.

O menino Lula viveu realmente as dificuldades e o cotidiano do Distrito daqueles tempos. Sobretudo, o abastecimento de água da população, feito em alguns chafarizes coletivos ou poços localizados nos bairros itapemenses.
Junto com o irmão Vavá e amigos ganhavam alguns trocados carregando água pros vizinhos e conhecidos. Há quem recorde da molecada, inclusive Lula, de "furar" lugar na fila a fim de encher latas e barris de água mais rápido (caso demorasse o pai lhe batia). Um destes lugares era o "Poço do Carpucio", atrás do Morro do Leme, no Bairro Jardim Cunhambebe. Seja equilibrando sobre os ombros numa trave vasilhas, latões ou puxando pipas d'água por uma corda pelas ruas de terra do Itapema.
ITAPEMENSES AGUARDAM NA FILA DO CHAFARIZ PARA ENCHER VASILHAS COM ÁGUA [ANOS DE 1940].

O portuário aposentado, Mauro Aprígio de Brito (65 anos), outro dos amigos de infância, recorda das marotagens que fez com Lula aproveitando-se do fato de ser mais velho:
"A gente buscava água-doce para a vizinhança, e eu cheguei a pagar algo como 50 centavos para o Lula puxar o barril..." - Que na verdade somente mostra quanto o garoto Luiz Inácio era esforçado.
Todos os dias, Lula e o irmão José Ferreira (Frei Chico) eram encarregados por Aristides à buscar água nas bicas de ITAPEMA/SP, também para a segunda mulher do pai, Valdomira. Em troca ela lhes dava pão velho:
"(...)A mãe pedia para a gente não aceitar, mas nós comíamos escondido..." - Confessa Luiz Inácio.
FILHOS DE ITAPEMENSES ROLAM PIPA D'ÁGUA PELAS RUAS DE TERRA DO BAIRRO [DÉCADA DE 1960].

A única coisa que Aristides Inácio da Silva ensinou aos filhos foi caçar. Era muito conhecido na região: Aristides, o caçador. Mateiro experimentado. No fim-de-semana ele não trabalhava para poder fazer caçadas e se divertir.
"(...)Ele nos levava nas caçadas. Acendia uma fogueira à noite para espantar as cobras e saía para caçar. A gente dormia ali, com medo..." - Menciona Lula.
Além de lazer, a caça garantia alguma alimentação para suas famílias, economia das despesas domésticas, lucro com a venda para conhecidos, tanto como prestígio no Sindicato.
Neste aspecto Aristides Inácio da Silva, migrante devidamente integrado, reproduz um antigo e típico hábito itapemense de exploração da restinga no Distrito, das matas adjacentes nas cidades vizinhas, visando a coleta de víveres e caça. Pesca artesanal no estuário, além de rios da região. Apanha de crustáceos pelos manguezais.   
Aos domingos, Lula e Ziza (José Ferreira) a mando de Aristides iam apanhar no mangue, caranguejos, mariscos e lenha nas matas dos arredores. Outras vezes, empreendiam pescaria na Bocaina (peixes, siris, camarão) utilizando-se da "chata" do pai, lá atracada, como forma de suprir as necessidades da família.
Um dia, num passeio a "chata" inundou, rememora Luiz Inácio, "e eu não sabia nadar. Fiquei parado, esperando. Meu pai me derrubou na água com uma remada na cabeça. Meus irmãos me salvaram..."
Aconteceu que roubaram o barco de Aristides, e ambos apanharam pra valer. O pai batia com cinto, vara, pedaço de corda, aquilo que tivesse a mão. Lula pela idade apanhava menos. Doutra feita, depois de mais uma "pisa" sofrida por Ziza, partiu pra sovar Lula:
"(...)Quando ele veio bater em mim, minha mãe não deixou. Aí ele deu uma mangueirada na cabeça dela e isso foi o começo da separação."
ARISTIDES INÁCIO DA SILVA PENSAVA CORRIGIR OS FILHOS À BASE DE PANCADAS - CENA DO FILME 'LULA, O FILHO DO BRASIL' [SET DE FILMAGEM ITAPEMA/SP].

De brincar na rua, quando podia, o futebol logo lhe encantou. Tanto mais ao ver as partidas no Campo do ITAPEMA F. C., sempre de casa cheia. Desde que ouvira pelo Serviço de Alto-falantes de Itapema, a conquista do Sport Club Corinthians Paulista, do IV Centenário (06/02/1955) fez seu coração corinthiano.
O Serviço de Alto-falantes, a cargo do Sr. Baraçal, retransmitia da Rádio Bandeirantes, narração do locutor esportivo Edson Leite. A disputa naquele Campeonato Paulista envolvia a Taça em comemoração ao 400 anos de São Paulo (Capital). A final era S. C. CORINTHIANS X S. E. PALMEIRAS. O empate dava o título ao alvinegro de Parque São Jorge. Luisinho de cabeça marcou para o Coringão. Depois Nei empatou o placar no Pacaembu. Os 15 minutos finais foram dramáticos. A equipe palmeirense atacava sem parar, mas Gilmar na meta corinthiana defendia tudo... Terminado o jogo, Lula vibrava pela Av. Thiago Ferreira.
PARTIDA DE FUTEBOL NO CAMPO DO ITAPEMA F. C.
    
Insatisfeita devido ao alcoolismo do marido, a condição a que fora relegada, Eurídice resolveu partir em 1954 para a Capital paulista, encontrando morada no Bairro do Ipiranga.
"(...)Um dia a mãe descobriu que a outra mulher do meu pai ganhava mais coisas que ela. Tinha uma quitanda e o pai mandava entregar os alimentos. Aconteceu de entregarem errado. A mãe foi acumulando raiva..." - Diz Lula. Daí num certo dia, Aristides quis bater em Lindu por causa de uma roupa muito velha, que não segurava mais ponto de costura. Outra mulher, ela suportava. Mas apanhar, não.
"(...)O pai nunca tinha botado a mão na minha mãe, até o dia em que pegou uma calça descosturada e esfregou no nariz dela..." - Menciona Maria da Silva, irmã de Lula. Embora estivador era hábito de Aristides ir trabalhar alinhado, de terno e gravata. Lindu disse naquele momento desacorçoada: "É a primeira e última vez. Quando voltar, não vai me encontrar". - Deu um basta.

["D. Lindu", Mãe-Coragem do Brasil]

"(...)Ela já tinha perdido os gêmeos. Eles nasceram em casa, com a ajuda da comadre. A mãe começou a passar mal, nasceram antes do tempo, de sete meses. Ela ficou 17 dias no hospital, sem conhecer ninguém. Um dia ela disse que ouviu o médico falar, "se reagir a esse medicamento, se salva". Ficou boa. Mas os gêmeos morreram com 20 dias, mais ou menos. A gente não sabia como cuidar, era criança, e o pai não tomou conhecimento. Morreu um num dia e o outro, no dia seguinte..." - Revela Maria, ressentida. - "(...)Quando minha mãe deixou o meu pai, disse para ele: "Se eu te encontrar na rua, vou passar de um lado da calçada e você do outro..." - Lindu cumpriu a palavra. Jamais quis saber dele de novo. Sequer notícia.
Por todo seu sacrifício, D. Lindu sempre foi uma heroína para os filhos. Exemplo de dignidade e comportamento honesto. Nunca roubou, nunca pediu, nem explorou mendicante sua prole. Se não tinha hoje, ela confiava que amanhã teria... As vezes a sorte ajudava.
"(...)Quando a mãe deixou o pai, ficamos morando um tempo lá, em Vicente de Carvalho [Itapema/sp]..." - Conta Vavá, que carregava caixotes no Mercado Municipal, na vizinha Santos e um dia encontrou embaixo de uma empilhadeira cinco conto e 800 mil réis, à época o salário mínimo equivalia a 160 mil réis. Assustado, pediu a um amigo para guardá-lo. Estava morrendo de medo do que Lindu ia dizer. - "(...)Se eu chegar em casa com esse dinheiro minha mãe me mata." - Remoeu o que fazer, procurou saber se alguém dera por falta, até contar a mãe, que decidiu. - "(...)Se ninguém reclamou até agora, vamos usar... (...) Depois de uma semana peguei o dinheiro de volta, dei 500 mil réis para o cara que tinha guardado. Foi o que nos salvou. Pagamos as dívidas. Devíamos sete meses de aluguel. Compramos roupas e nos mudamos para São Paulo." - Diz o sortudo do Vavá.
Após a separação, Lula e seu irmão José Ferreira (Ziza) ficaram morando algum tempo ainda com o pai e sua segunda família, mudando-se também para a capital de São Paulo, junto da mãe Eurídice, no ano de 1956. Passado os anos, iriam para a Vila Carioca, em São Bernardo do Campo/SP.
LUIZ INÁCIO GAROTO COM A FAMÍLIA NUM FIM DE SEMANA NO LITORAL PAULISTA.

A partir daí a história de Luiz Inácio "LULA" da Silva tornou-se um marco do Brasil. Porque Lula vivenciou neste caminho dificuldades semelhantes às de grande parte da população brasileira.
Formou-se Torneiro Mecânico pelo Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). Assim empregou-se nas Indústrias Villares, em São Bernardo, quando também começou a participar do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema.
Após ocupar diferentes cargos no Sindicato, elegeu-se Presidente em 1975, sendo reeleito em 1978. Os sindicatos dos trabalhadores da região do ABC Paulista participaram ativamente, por meio de movimentos grevistas das contestações ao Regime Militar brasileiro e da luta por mais direitos e melhores salários para a classe trabalhadora no final dos anos 70, num momento que Lula já era o principal líder sindical.
O SINDICALISTA LUIZ INÁCIO "LULA" DISCURSA PARA A "COMPANHEIRADA" EM GREVE.

Com o recrudescimento da Ditadura Militar, durante as greves do ABC em 1978, que dariam popularidade a Lula, este refugiou-se anonimamente naqueles tempos, na Conceiçãozinha (ITAPEMA/SP), conforme conta o companheiro Newton Rafael Gonçalves.
Em 10 de Fevereiro de 1980, ajudou a fundar o PT - Partido dos Trabalhadores, que representava a união de centenas de milhares de pessoas ligadas aos movimentos sindicais, sociais, grupos de esquerda e intelectuais.
ENCONTRO NACIONAL DE FUNDAÇÃO DO PT - PARTIDO DOS TRABALHADORES [1980].

Candidatou-se a Governador do Estado de São Paulo na eleição de 1982. Em 1983, Lula ainda participou com outros companheiros da fundação da CUT - Central Única dos Trabalhadores. No ano de 1984, atuou como uma das principais lideranças da Campanha 'Diretas Já', para restabelecer eleições à Presidência da República. Em 1986, foi eleito o Deputado Federal mais votado do Brasil para a Assembléia Nacional Constituinte.
LULA NA CAMPANHA PELAS 'DIRETAS JÁ' [1984].
LUIZ INÁCIO "LULA" DA SILVA DEPUTADO FEDERAL MAIS VOTADO DO BRASIL - ASSEMBLÉIA NACIONAL CONSTITUINTE [1986].
  
Após três tentativas Luiz Inácio "LULA" da Silva foi eleito Presidente da República Federativa do Brasil. Para o período de 2003 à 2006 e reeleito para o segundo mandato de 2007 à 2010.
Antecedendo a Campanha que o levaria à Presidência, Lula percorreu o país conduzindo a 'Caravana da Cidadania' (2002) e passou por ITAPEMA/SP, juntando inúmeros itapemenses no Bairro Vila Alice.
Tal acontecimento em virtude das circunstâncias, que levaram Luiz Inácio "LULA" da Silva a Presidente da República, de certa forma dá relevância a ITAPEMA/SP ao colocá-lo no curso da História brasileira, como breve pousada do "Filho do Brasil".