__________ Itapema, suas histórias... __________

segunda-feira, 31 de maio de 2010

NÁUFRAGOS DA MARGEM ESQUERDA


Navio 'AIS GIORGIUS' durante incêndio, já na margem esquerda (VTE. CARVALHO/SP), em Janeiro de 1974.

Um dos acidentes portuários que as duas margens compartilham, foi o incêndio no navio a motor, de bandeira grega 'AIS GIORGIUS', em Janeiro de 1974.
Sob o comando do Capitão Marino Moatsos, com 26 homens de tripulação, provindo da Europa, o 'AIS GIORGIUS' entrou pela manhã do dia 26 de Dezembro (1973) no porto, quando atracou no cais do armazém XXX.
O cargueiro havia sido construído na década de 50 para a Armadora sueca 'Brostom' e consignado a Agência Marítima 'Oceanic Shipping'. Transportava em 5 porões, latas de leite em pó, óleo de pinho, champanhe e milhares de sacos de produtos químicos (resina sintética, nitrato puro, fertilizantes, tambores com manganês-metálico) num total de 67.000 volumes.
O 'AIS GIORGIUS' arde em chamas nas imediações da PRAINHA, junto ao "Paredão", em ITAPEMA (1974).

Era 08 de Janeiro de 1974, o navio encontrava-se atracado agora no armazém XXXII quando teve início o incêndio. Vejamos trecho do relato publicado no blog 'Universo Portuário', por Laire Giraud, extraído do livro 'Sinistros Marítimos na Costa do Estado de São Paulo':
"Paradoxalmente o sinistro não se iniciou nos porões do navio, mas numa galera ferroviária (vagão-aberto) pertencente à CDS (vagão nº 40) que se encontrava carregando ao longo ao longo do AIS GIORGIUS... (...) Tal fato provocou o aquecimento externo do casco do porão do navio grego onde estavam estocadas os restantes 1.200t. de nitrato de sódio, o porão nº 4 sendo o primeiro afetado..." - O fogo propagou-se rapidamente, eram 22:30h. As chamas atingiram 50 metros de altura e toda Itapema correu pra ver, durante anos na minha infância ouvi relatos do clarão naquela noite.
Catraieiros atuaram como salva-vidas durante o incêndio (que matou um tripulante da Turma de Salvamento). Aqueles que faziam o plantão noturno acudiram resgatando tripulantes, estivadores e conferentes que se atiravam no mar para fugir das chamas. ( na foto acima (1974),  as explosões e as chamas no 'AIS GIORGIUS' iluminavam a noite.

Os restos calcinados do 'AIS GIORGIUS' após o sinistro. (1974)  

Para evitar um desatre maior, pois as chamas ameaçavam outros navios e instalações portuárias, as autoridades resolveram desatracá-lo para a margem esquerda utilizando os rebocadores 'Saboó, 'Marie', 'Neptuno' e 'Plutão' em meio a explosões e gigantescas labaredas que se sucediam, vindo o 'AIS GIORGIUS' a encalhar nas proximidades da "Prainha", junto a Torre de Transmissão de Alta Tensão da Usina de Itatinga (no final da Rua Nova), também conhecido como "Paredão", devido ao antigo atracadouro ali construído. Queimou durante 70 horas seguidas, ficando  semi-submerso e de sua estrutura apenas a proa estava intacta.
Carcaça do 'AIS GIORGIUS' encalhada tempos depois na altura da Estação das Barcas, anos 90 (ITAPEMA/SP).

Por duas décadas ele prestou-se as estripulias de moleques audazes. Indagado particularmente em uma entrevista para a Revista 'Ao Vivo', ano 2, Edição 7 (Out/Nov/Dez de 2007), Herbert Viana (integrante da Banda 'Paralamas do Sucesso') respondeu ao repórter Thiago Santos:
"(...)Porque eu tinha morado, quando era criança, na Base Aérea (de Guarujá - Itapema - SP), ou seja, era do lado de cá do Porto. Em frente à minha casa tinha ainda um resto de mato e o canal, aí você via o porto do outro lado, a movimentação, a chegada dos navios de carga e de passageiros... E mais ou menos em frente à essa Vila Militar, da Base Aérea, tinha um navio encalhado (AIS GIORGIUS) que pra gente naquela época era o grande desafio de quem conseguia nadar até aquele navio, e dali subir na parte que não estava submersa. E, enfim, pular na água da maior altura possível... (...)Enfim, pra gente naquela época era um fascínio, difícil de descrever..."
 'AIS GIORGIUS' naufragado na margem esquerda do Distrito de Vicente de Carvalho (anos 90).

Totalmente inutilizado foi vendido para desmanche, todavia:
"(...)Tal coisa porém nunca acontecia pois no processo de reboques os cabos que o prendiam à arrebentaram (a proa), durante uma tempestade de vento o AIS GIORGIUS foi encalhar, levado pela correnteza na altura da Estação de Barcas de Vicente de Carvalho, em posição submersa e perigosa a navegação..."




Outro navio, o 'AUSTRAL' (foto à esquerda), anos antes (1967), numa circunstância parecida de passagem de ano, fora vítima de sinistro no Porto.
O cargueiro a motor 'AUSTRAL' atracou junto ao armazém XXV, no dia 27 de Dezembro de 1966, procedente do Chile com carga geral de 3.109 toneladas de salitre. A tripulação total era de 45 homens, comandados por Umberto Cárdenas Hurriaga.
Às 14:28min, do dia 02 de Janeiro de 1967 (segunda-feira) irrompeu um incêndio no porão nº 4. O foco teve início em uma lingada de sacos de salitre que estava sendo descarregada. Alguns sacos em chamas caíram no interior do porão, se propagando assim o fogo por toda a carga. Em poucos minutos as labaredas atingiram cerca de 30 metros de altura, fato este referido certa vez por Seo Carlos, antigo morador do Itapema.
Combateram arduamente o incêndio com jatos d'água sobre o convés do cargueiro, os rebocadores 'Saturno', 'Saboó' e 'Sabre'. Três tripulantes da embarcação de bandeira chilena feriram-se durante o sinistro.
Como fosse difícil extinguir as chamas, o 'AUSTRAL' foi desatracado e rebocado até Conceiçãozinha. Sucessivas explosões fizeram com que o incêndio se alastrasse atingindo outros compartimentos do navio e comprometendo sua estrutura, com entrada de água nos porões, levando-o a adernar consideravelmente a bombordo.
O navio 'AUSTRAL' à deriva na margem esquerda, próximo de Conceiçãozinha (1967), enquanto os rebocadores combatem o fogo.

O incêndio seria totalmente debelado por volta das 6 horas da manhã, do dia 03 de Janeiro. Entretanto o fogo voltou a arder na manhã do dia 04, tornando mais crítico o estado do navio. No final da tarde daquele dia o adernamento acentuou-se e a popa já estava ao nível d'água.
O 'AUSTRAL' ficou praticamente destruído, dele restando somente o casco e um monte de ferros enegrecidos, após isso levaram-no para as imediações da Bocaina, onde foi desmontado pela empresa Grieves. 

sexta-feira, 21 de maio de 2010

TPI - TEATRO POPULAR DE ITAPEMA


LOGOTIPO DO TPI - TEATRO POPULAR DE ITAPEMA (fund. em 19/11/1988)

No final dos anos 80, eu iniciava minha trajetória no TPI - TEATRO POPULAR DE ITAPEMA. Aliás diga-se de passagem, um dos poucos grupos com proposta de Teatro sério que se soube nesta cidade. Prevaleciam peças litúrgicas (Autos, Mistérios), alguns dramas históricos (cangaço, abolição da escravatura etc) e algumas comédias de costumes, picarescamente encenados. Ou episódicas experimentações teatrais.
Fundado em 19/11/1988, numa sala da Escola José Cavariani. A princípio teve como seu mentor e Diretor Artístico Luiz de Assis Monteiro, oriundo da USP. Era formado por jovens e iniciantes artistas, que viam no Teatro uma maneira de contribuir para a melhoria da sociedade. Despertar o interesse do povo em ir ao teatro, a fim de promover possível transformação social. O TPI tinha como objetivo apresentar espetáculos a preços populares, com apuro e todo aparato técnico (luz, som, cenário, figurino etc), que de alguma forma refletissem a realidade das pessoas.

[Urbain G. como Professor - Aquele que diz sim & Aquele que diz não, de Bertolt Brecht]


Em quase 5 anos de existência levou à cena onze espetáculos (entre textos infantis e adultos) e recebeu seis peças teatrais convidadas das cidades de Santos, São Paulo e Guarujá, tendo um público estimado por volta de 4.300 espectadores. Foi o primeiro na cidade a montar textos dos grandes nomes da dramaturgia universal (DUERRENMATT, IONESCO, ARRABAL) e utilizar-se do Método Stanislavsky para preparação de seus atores. O trabalho corporal envolvia técnicas de Meyerhold, Mikhail Tchekhov e Grotowsky.
Outro fato inovador foi a manutenção de temporadas regulares dos espetáculos encenados e a excelência do repertório, incluindo autores nacionais (ROBERTO FREIRE, PEDRO BANDEIRA, CELSO LUÍS PAULINI, dentre outros). O TPI apresentou-se ainda em escolas da Capital (SP), na Universidade de São Paulo (ECA-USP) e também em festivais de Teatro da região.
'DESIMBUCHA DELAID'S' (1990) TPI - ao centro URBAIN G. como jovem oprimido.
Teatro Popular de Itapema - 'O DEFUNTO', de Rene de Obaldia (1989) - à direita URBAIN G. no papel de Julie.
TPI - 'AQUELE QUE DIZ SIM & AQUELE QUE DIZ NÃO', de Bertolt Brecht (1991) - à esquerda baixa URBAIN G. (Professor).
 Teatro Popular de Itapema - 'DIÁLOGO NOTURNO DE UM HOMEM VIL', de Friedrich Duerrenmatt (1993) - Direção: URBAIN G.

Preocupação constante foi a atuação política. Durante a Constituinte Municipal de 1990, o Teatro Popular de Itapema promoveu três Intervenções Teatrais de Rua inspiradas no 'Teatro do Oprimido', de Augusto Boal e dirigidas por mim, Urbain G. Que resultou em manifestações teatralizadas sobre a condição de vida do munícipe versus o jogo político, o monopólio e a precariedade do serviço de ônibus, e desfecho com o enterro simbólico da Câmara de Vereadores.
INTERVENÇÃO TEATRAL NA PRAÇA 14 BIS (1990) TPI - "O trabalhador sob as amarras da política local. Para Ele uma marmita de bosta, enquanto 'Ernesto Paga-mais' enchia um pinico de dinheiro." - Direção: URBAIN G.
INTERVENÇÃO TEATRAL NA AV. THIAGO FERREIRA (1990) TPI - Inspirados por Augusto Boal, crítica contundente à politicagem, contra o monopólio da Viação Guarujá. - Direção: URBAIN G.
 PROTESTO E INTERVENÇÃO TEATRAL PELAS RUAS DE ITAPEMA/SP (1990) TPI - Féretro e enterro da Câmara Municipal de Vereadores. - Direção: URBAIN G.

São desses idos: Lamira Vieija (A LIÇÃO), Lu Fagundes/Elenita Rufino (AQUELE QUE DIZ SIM e AQUELE  QUE DIZ NÃO), Nalva Cardozo (EXERCÍCIO DE BONDADE), Jean Fariseu (A TRILOGIA DO AMOR), Eduardo Ricci (EM BRASÍLIA, 19 HORAS)  Osvaldo Jr. (ZOO STORY), Elson Maceió (INTERVENÇÕES TEATRAIS DE RUA), Rogério Martinelli (DIÁLOGO NOTURNO DE UM HOMEM VIL), Jane Dumont (QUARTO DE EMPREGADA), Cosme Costa/Solange Santos (DESIMBUCHA DELAID'S), Sérgio Lampadinha/J.E. Soares Leite (A POÇÃO MÁGICA) e grande elenco.
CARTAZ CONFECCIONADO PELO TPI PARA COLAGEM NOS POSTES DE ITAPEMA/SP.
FILIPETA UTILIZADA PELO TEATRO POPULAR DE ITAPEMA PARA DIVULGAÇÃO DE SEU ESPETÁCULO.

A sala de espetáculo adaptada de um corredor que seguia para a quadra de esporte, lado este emparedado pela Direção da Escola. Com cerca de 10 m X 6 m, teto baixo (4 metros de altura). À esquerda o cômodo de uma antiga cantina (que serviu de camarim, coxia, oficina, cabine de operação luz e som). À direita anexo, usado como coxia, sala de reunião. Do lado contrário ficava a porta de entrada e uma arquibancada com capacidade para 100 espectadores (bem juntinhos), seu palco (em negro) ao rés do chão tendo aproximados 6 metros de largura por 7 metros de profundidade. Estrutura compacta de um teatro de câmara. Dispunha de equipamento de som stéreo, refletores de luz 500 w. (pc) fixados ao teto e mesa de luz artesanal provida de dimmer. 
URBAIN G. atuou e dirigiu espetáculos do TPI - Teatro Popular de Itapema.

Ocasionalmente, após os ensaios ou apresentações costumávamos espairecer nas noitadas do "calçadão" da Thiago Ferreira. Discutia-se Stanislavsky, Anarquismo, a experiência brechtiana, o papel social do Artista. Enfim, aquilo que nos movia... A charrete perdera o condutor conforme Raul Seixas autorizara imprimir, mas nós tínhamos a pretensão de conduzir a história de Itapema.
Durou até Maio de 1993 o TPI, quando deu por encerrada suas atividades. Em 2003 houve uma tentativa de retomada da experiência teatral, desta feita malfadada.
Animação de Festa 'A FARRA DO BOI' (1992) Teatro Popular de Itapema - URBAIN G. como Brincante.

sábado, 15 de maio de 2010

LYDIO MARTINS CORRÊA - poeta itapemense

A POÉTICA ITAPEMENSE DE LYDIO MARTINS CORRÊA.
 
          "(...)Quantas vezes relembro este Itapema 
          Dos tempos idos, barca a dois tostões,
          Daqueles priscos tempos dos balões,
          Da vida boa, sem nenhum problema..."

          "(...)O Itapema é terra onde eu vivi
          Quase toda extensão da minha vida;
          Adoro este lugar pois foi, aqui,
          A terra que me deu toda acolhida..."

A ITAPEMA/SP QUE LYDIO MARTINS CORRÊA CONHECEU [DÉCADA DE 1920].

É deste modo inspirado que Lydio Martins Corrêa [imagem ao lado.] refere-se nos seus versos d'alma ao ITAPEMA/SP, ou Distrito Municipal Vicente de Carvalho (gentileza para com o poeta do mar).
Parte de sua poesia é um passeio no velho Itapema. Por vezes ufano, bucólico, retrata a paisagem da mata inculta: o mangue, "a vargem grande cobiçada" coberta de capinzais alagados, xaxins, a revoada de vagalumes no rincão itapemense. Detém seu olhar na expansão comercial dos bananais (Pae Cará, Vila Áurea), depois o loteamento destas áreas. Os sítios, o bambuzal da Conceiçãozinha, o movimento das embarcações no estuário, a faina da carpintaria naval servem de cenários à sua criação.
Fala-nos da gente que engrandecia as paragens à noroeste da Ilha de Santo Amaro.

          "(...)Conceiçãozinha... Imensos bananais
          Dilatavam-se em todas direções,
          Terras planas, talvez de aluviões,
          Cobertas de xaxins e capinzais..."

          "(...)O que tu sentes, Celso, é nostalgia
          Da Bocaina saudosa, sempre calma,
          O tempo, ali, parava e dava à alma,
          Motivo de beleza e de alegria..."                  

Certa angústia detecta as transformações do vilarejo estuarino que havia defronte ao Largo de Santa Rita, próximo ao Saco da Embira. A perda da inocência e o compromisso com a subsistência. O tempo que se esvai inexorável. E seu desgosto pela ocupação desordenada. Que para ele, trouxe o vício, furtos e as mazelas sociais.

          "(...)Mas tudo se transforma, é o progresso
          Que se vai infiltrando, tem acesso
          Na vida do seu povo, humilde gente,..."

          "(...)Tudo acabou, jamais vai vê-la um dia;
          Isso que tens na mente ardente e incalma
          Vai, aos poucos, cedendo e alcança a palma
          Junto do teu lirismo e da poesia..."

Lydio Martins Corrêa nasceu no dia 15 de Julho de 1909, na cidade de Santos/SP. Filho de Joaquim Martins Corrêa e Aida da Silva Corrêa, foi o segundo filho de uma prole de 21 irmãos.
Na juventude praticou diversas modalidades esportivas. Como boxe, arremesso de peso e dardo, salto com vara e levantamento de pesos. Ganhou inúmeras medalhas que guardava com muito orgulho.
Começou a trabalhar cedo o que dificultou-lhe os estudos. Conseguiu estudar até o 3º Ano do Curso Comercial, no colégio Liceu São Paulo, em Santos. Todavia, os boletins escolares atestavam ser um ótimo aluno, o qual aprendia facilmente.
LYDIO MARTINS CORRÊA, POETA ITAPEMENSE AOS VINTE ANOS.

Um de seus empregos quando adulto, seria numa oficina mecânica marítima. Por muitos anos foi Torneiro Mecânico fabricando peças específicas para a área naval. Ainda na vizinha cidade santista abriria a própria oficina.
Já residindo em ITAPEMA/SP estabeleceu outra oficina mecânica. Nessa época adquire Carteira Marítima, de 1º Maquinista, possibilitando-lhe trabalhar em diversos navios mercantes como Chefe de Máquinas.
Em 1931, casou-se com Eliza Morrone Corrêa, com quem teve 5 filhos: Guliart, Archimedes, Rubens, Jurandir e Lydio Junior. 
Era também amante da música, tocava saxofone e clarinete. Aos domingos apresentava-se no Salão de Bailes da Bocaina.
LYDIO MARTINS CORRÊA E A ESPOSA ELIZA MORRONE EM 1974.


Político militante foi Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Guarujá/SP, no período de 1949 à 1954 [retrato ao lado], exerceu também o cargo de 1º Secretário,  consideravam-no grande orador e excelente redator. Se tornou célebre um discurso seu na Câmara defendendo a utilização de maiôs nas praias da cidade. Pois, aventava-se a possibilidade de proibição nacional, segundo vontade do Sr. Jânio Quadros.
Lydio Martins Corrêa dá nome à importante via expressa que leva ao Bairro Morrinhos, no Distrito. Conforme Decreto Municipal 3.309, assinado na data de 29 de Fevereiro de 1984, "considerando a meritória atuação política do vereador ao qual se devem inúmeros melhoramentos públicos..."
VIA LYDIO MARTINS CORRÊA ACESSO AO BAIRRO MORRINHOS - ITAPEMA/SP [2011].

Poeta cônscio escreveu sonetos e poemas, alguns por solicitação de pessoas amigas. Como se pedissem a Lydio que desse voz aos seus sentimentos, e assim pudessem exprimí-los através dele. Também outros tantos em homenagem à pessoas queridas. Fez inspiração da sua convalescença tendo sido socorrido ao Hospital Santo Amaro. Era madrugada do dia 13/04/1979, compôs no escuro o soneto 'No hospital'. Sua poesia de feitio maneirista, apresenta tom parnasiano bem como do romantismo brasileiro. Teve por referências literárias Martins Fontes, Castro Alves e J.G. de Araújo Jorge.
Soube manifestar como poucos o imaginário itapemense, sendo o primeiro a fazê-lo de forma poética. Neste tema demonstra destreza literária a imprimir originalidade ao verso.

          "(...)Do Pai-Cará sempre guardei lembrança,
          Os Backheuser: o velho Odil também,
          Reminiscências, tempo de criança,
          Barca a vapor, locomotiva, trem..."

[capa do livro do poeta Lydio Martins Corrêa]

Seu único livro publicado após sua morte (09/Janeiro/1983), 'VERSOS D'ALMA' reunindo 173 poemas do poeta itapemense, foi editado em Junho de 1984, em colaboração com a Câmara Municipal de Guarujá. A edição teve como revisora Maria Aparecida Gama Figueiredo. Enquanto a capa, criada por Everaldo Pires e Apresentação de Francisco Figueiredo.

VISTA AÉREA DO BAIRRO VILA BOCAINA, GRADATIVAMENTE EXPULSO DE SEU SÍTIO ORIGINAL - ITAPEMA/SP [ANOS DE 1940].

                                   VELHO ITAPEMA II

                    O Riacho e a Bocaina, eu lembro ainda,
                    Aquela boa gente, os pescadores,
                    Homens distintos, nobres, só valores
                    Desta história tão simples, porém linda.

                    Depois, Saco da Embira, a trilha infinda...
                    E os Morrinhos? Aí rebocadores
                    Foram construídos nesses arredores,
                    No estaleiro naval... eu lembro ainda,

                    Entretanto, lembrar o que adianta?!
                    O que passou é coisa sacrossanta
                    E revivê-la, às vezes, dá tristeza.

                    Vamos deixar em paz essas memórias,
                    Deixemos inumadas que são glórias
                    Do nosso povo, grande em singeleza!...

PÍER BANANEIRO - ITAPEMA/SP [DÉCADA DE 1920].

                                   VELHO ITAPEMA IV

                    Para falar de toda  esta baixada,
                    Velho Itapema de simplicidade,
                    Precisamos rever a realidade
                    Dos esconsos rincões, desta adorada

                    Terra da vargem grande, a cobiçada
                    Dos grandes plantadores, de verdade,
                    Da "Musa sapien tum", a qualidade
                    Que aqui logo encontrou sua morada.

                    E os bananais as áreas dominaram
                    De tal forma que, até mesmo, obstaram
                    Plantações de quaisquer outros produtos.

                    Desdobraram-se, aqui, esses eventos
                    Que deram a este solo os elementos
                    De ser inigualado nesses frutos...

REGIÃO DA OUTRORA 'VILLA PAE-CARÁ [ITAPEMA/SP].

                                   VELHO ITAPEMA III

                    Do Pai-Cará sempre guardei lembrança,
                    Os Backheuser: o velho Odil também,
                    Reminiscências, tempo de criança,
                    Barca a vapor, locomotiva, trem.

                    Aqui tudo era simples, que bonança!
                    As trilhas sinuosas iam além
                    Do matagal, do mangue, onde ninguém
                    Sentia algum temor ou insegurança.

                    Agora, já passados tantos anos,
                    É tudo diferente e desenganos
                    Assediam, de fato, todo o povo...

                    E o tempo vai passando e nunca volta,
                    O pensamento gera até revolta
                    Contra o passado, por não vir de novo!...

ITAPEMA/SP - ILHA DE SANTO AMARO [LITORAL PAULISTA].

                                   VELHO ITAPEMA I

                    Nas paragens alegres do Itapema,
                    Do Itapema vivido em outra era,
                    Havia poesia, oh! quem me dera!
                    Que voltasse esse tempo sem problema.

                    A vida era pacata, sem dilema,
                    Também sem poluição da atmosfera,
                    Era sempre uma eterna primavera,
                    Uma canção de amor, era um poema.

                    Mas tudo se transforma, é o progresso
                    Que se vai infiltrando, tem acesso
                    Na vida do seu povo, humilde gente,

                    Agora existe até dificuldade
                    Em quase tudo, sim, quanta saudade
                    Dos tempos bons da vida tão ridente!

A ESTUARINA ITAPEMA/SP [LITORAL PAULISTA].

                                   VELHO ITAPEMA VI

                    És, Itapema, a flâmula querida
                    A tremular ao vento do progresso
                    És terra nobre, a todos dás acesso
                    És, para todos, mãe estremecida.

                    Vivem a procurar-te, nesta vida,
                    Como lugar quieto isto eu confesso,
                    E embora recatado, no recesso,
                    Não negas para o povo esta acolhida.

                    Encontrarás um dia a tua glória,
                    Serás reconhecido pela história
                    Ó terra sã de gente varonil,

                    Porque daqui sairá, um palinuro
                    A comandar com fé, muito seguro,
                    Esta nau, pedacinho do Brasil.

A ESTRADA DE FERRO SP-2066 PASSAVA AO LARGO DO SÍTIO CONCEIÇÃOZINHA [ITAPEMA/SP].

                                   VELHO ITAPEMA V

                    Conceiçãozinha... imensos bananais
                    Dilatavam-se em todas direções,
                    Terras planas, talvez de aluviões,
                    Cobertas de xaxins e capinzais.

                    Terrenos muito férteis que jamais
                    Alguém deixou ficar sem plantações
                    E a isso bem atestam os chatões
                    Para os embarques nos navios, no cais.

                    Há pouco tempo alguns agricultores
                    Lotearam suas terras, teus valores,
                    Quem sabe por questões de economia

                    Hoje estão as indústrias já plantadas
                    Nessas áreas, e algumas dilatadas, 
                    Mostrando do progresso a euforia!

O ASPECTO DO BAIRRO VILA BOCAINA E SEUS MORADORES [ITAPEMA/SP].

                                   NOSTALGIA

                    O que tu sentes, Celso, é nostalgia
                    Da Bocaina saudosa, sempre calma,
                    O tempo, ali, parava e dava à alma,
                    Motivo de beleza e de alegria,

                    Tudo acabou, jamais vais vê-la um dia;
                    Isso que tens na mente ardente e incalma
                    Vai, aos poucos, cedendo e alcança a palma
                    Junto do teu lirismo e da poesia.

                    Hoje não mais existe aquele encanto
                    A enlouquecer idéias sonhadoras,
                    Essas que amam, mesmo, de verdade.

                    Vives distante, agora e, no entanto,
                    Desconheces as causas portadoras
                    Desta aflição, da dor desta saudade.

ANTIGOS MORADORES DO SÍTIO CONCEIÇÃOZINHA [ITAPEMA/SP].

                              OS BAMBUS DE CONCEIÇÃOZINHA

                    Nesta simples estrada quase oculta
                    Pelos bambus que ensombram seus contornos,
                    Nela se encontra, nestes dias mornos,
                    O encantamento da floresta inculta.

                    E quando o sol no abismo se sepulta
                    Projetando, no céu, belos adornos,
                    Aos pássaros que voltam, só transtornos
                    De toda esta beleza, então resulta.

                    A pipilar os pássaros com medo
                    Da tarde que, aos poucos, enlanguesce,
                    Das ramagens se escondem no sombredo,

                    Dentro de fofos ninhos há queixumes,
                    Concentra-se a penumbra, a noite desce,
                    Mas cintilam no escuro os vagalumes.

VISTA AÉREA PARCIAL DE ITAPEMA/SP À MARGEM ESQUERDA DO ESTUÁRIO - LITORAL PAULISTA [1939].

                              JUNTO À ESTRADA (CROMO)

                    Um chalé, u'a morada
                    Juntinho do bambual
                    Que fica naquela estrada
                    Rumando para o canal,

                    Onde se assiste a chegada
                    De toda frota naval,
                    Sempre benvinda e esperada
                    Para o porto e a capital.

                    Ali, naquela casinha
                    Bem modesta e simplezinha
                    Dando ar de abandonada,

                    Vive a pessoa querida,
                    Caprichosa e dedicada,
                    Cheia de amor, muito amada.

ANTIGOS MORADORES DO BAIRRO VILA BOCAINA [ITAPEMA/SP].

                                   SÍTIO ESCONSO

                    Era cinzento-claro o chalezinho;
                    Poucos vizinhos, um lugar ameno,
                    Fora construído à beira do caminho
                    Que era plano e bem seco esse terreno.

                    Nada era imenso, tudo era pequeno
                    Mas existia, ali, muito carinho,
                    Parecia, isto é certo, um quente ninho
                    Cheio de paz, isento de veneno.

                    Em frente havia, em forma de pomar,
                    Algumas plantas, dava p'rá contar
                    Os pés de fruta agreste; que beleza!...

                    Já não existe mais esse pedaço
                    De terra humilde e linda como um laço
                    Que prende os seres bons à natureza.

BANHISTAS NA LAGOA DA 'GAMBOA DO JUCA' - SÍTIO CONCEIÇÃOZINHA [ITAPEMA/SP].

                                   RECORDAÇÕES

                    Lembras, querida, em Conceiçãozinha,
                    Junto à avenida, a praia, a ponte, o bar?
                    Lembras também daquele nosso lar,
                    Nos fundos do terreno?... Que casinha!

                    Quanta graça e encanto aquilo tinha,
                    Sempre os evoco, como é bom lembrar...
                    O jardim, as fruteiras, até o mar,
                    E aquela aragem que dele nos vinha.

                    A tardinha o chilreio... Aves benditas,
                    Pareciam medrosas e aflitas
                    À procura de abrigo no bambual,

                    Enquanto nós juntinhos, docemente
                    Erguíamos castelo em nossa mente,
                    Na emulação sublime do real!

A ESTUARINA ITAPEMA/SP ÀS MARGENS DA ILHA DE SANTO AMARO [LITORAL PAULISTA].

                                   VERDADE

                    É um tosco matagal que me fascina
                    E que me prende em tal contemplação
                    Bucólica paisagem, tela fina
                    Que é poesia, beleza e sedução.

                    Este mar calmo, o céu, esta neblina
                    Que se desfaz, bem cedo, à viração,
                    É um quadro natural que, inda, me ensina
                    A me prostrar em plena adoração.

                    Ah! Como é bela toda a natureza!
                    Estas cousas me falam com franqueza
                    De tudo que é real em nossa vida.

                    Mas como é triste ouvir lá na cidade
                    Falar sobre política e maldade
                    Abatendo a moral já tão corroída.

CHALÉS AO LONGO DA AV. THIAGO FERREIRA [ITAPEMA/SP] 1963.

                              RECORDANDO PRISCAS ERAS

                    Quantas vezes relembro este Itapema
                    Dos tempos idos, barca a dois tostões,
                    Daqueles priscos tempos dos balões,
                    Da vida boa, sem nenhum problema.

                    Mas o progresso trouxe novo esquema
                    P'rá melhorar, com boas intenções,
                    Mas tal esquema, fruto de ilusões,
                    Criou, para este povo, outro dilema.

                    Continuou aos trancos e barrancos,
                    Prejudicando os homens bons e brancos,
                    E fez deste distrito tão pacato

                    Um centro só de vício e malandragem,
                    De furtos e de saques, de pilhagem,
                    Envergonhando um povo intimorato.

CENTRO COMERCIAL DE ITAPEMA/SP - AV. THIAGO FERREIRA [LITORAL PAULISTA].

                              O ITAPEMA FOI BAZAR DE VOTOS

                    O Itapema é terra onde eu vivi
                    Quase toda extensão da minha vida;
                    Adoro este lugar pois foi, aqui,
                    A terra que me deu toda acolhida.

                    É um solo humilde, mas sempre senti
                    Que ele me deu a mais bela guarida,
                    Nele criei meus filhos e sorri
                    E sorrindo venci a dura lida.

                    Este pedaço do Brasil, outrora,
                    Assediado por oportunistas
                    Era mina de votos a granel,

                    Mas hoje já raiou a nova aurora
                    E o povo bom, daqui, abriu as vistas
                    Mudando da política o painel.