__________ Itapema, suas histórias... __________

sábado, 5 de maio de 2012

MEMÓRIAS DO FORTE DE ITAPEMA

NA MARGEM ESQUERDA, O FORTE DE ITAPEMA/SP FRONTEIRIÇO A VILA DE SANTOS [SÉCULO XVIII].

O pai lhe falara da importância do Forte de Itapema quando em 1830 esteve por aqui o Marechal Daniel Pedro Muller. Seu avô, soldado da infantaria foi ficando, tornou-se caseiro e a prole então, filhos deste solo. Gostava de ouvir os causos contados pelo velho, que passaram de um soldado a outro...
Algum tempo depois dos portugueses chegarem ao Brasil, o Fortim  já existia. Protegia a Vila de Santos contra corsários e piratas, cruzando fogo com o Forte da Vila do outro lado entre o "Rio de São Vicente" ou como chamavam, nosso estuário, os indígenas: "Guarapiçumã" . Isso sob o comando de Francisco Nunes Cubas, sobrinho de Brás Cubas, designado por El Rey D. João V.
PLANTA DO FORTE DE ITAPEMA SÉCULO XVIII.

Ficou abandonado uma certa época até que em 1670 seu novo comandante Pedro Taques de Almeida promoveu a reconstrução da muralha de pedras e argamassa, mais os paióis...
Tinha também o pai suas estórias preferidas... Como esquecer os lances da disputa amorosa entre o filho homônimo do Sargento-mor da Fortaleza do Itapema Domingos da Silva Monteiro e um certo Capitão de Infantaria Manuel Vieira Calassa pela mão de Margarida Carvalho, naqueles remotos anos de 1667? Quando Domingos da Silva Monteiro Filho pedira a moça em casamento, esta já havia sido cortejada pelo Capitão Calassa e recusado oferta de matrimônio. Despótico e metido a valentão ele intimidara o pai da jovem a fim de tê-la na marra. Ainda assim, este permitiu que a filha obedecesse a vontade do coração. Não se deu por vencido o Capitão e buscou no arquivo da Câmara da Vila de São Vicente, coberto nas trevas da noite, documentos que comprometessem ou difamassem a família e a descendência do pretendente rival. Mas enlouquecido e contrariado de amor, num descuido com o candieiro de latão ateou fogo nos livros e papéis antigos da Capitania.
   O FORTE DE ITAPEMA [SÉCULO XIX], NESTA REPRODUÇÃO DA PINTURA A ÓLEO DE BENEDITO CALIXTO.

Por estas paragens, no ano de 1777, as notícias que chegavam do sul eram aterradoras. Em disputas territoriais com Portugal, os castelhanos depois de dominarem Rio Grande de São Pedro avançavam para o norte do território brasileiro. O Comandante chefe dos espanhóis era o Vice-Rei do Rio da Prata, o temido Dom Pedro de Cevallos. Houve quem largasse a agricultura para se alistar na Companhia do Forte. Entretanto, a invasão espanhola não passou de rumores.
A MOVIMENTAÇÃO EM TORNO DO FORTE DE ITAPEMA [1903].

Os anos passavam e por vezes o valente Forte ficava desguarnecido, quase em ruínas.
"- Bravos, Senhores!... Este posto que esteve sob a guarda de meus parentes, o Sargento-mor Torquato Teixeira de Carvalho, o Capitão-mor João Teixeira de Carvalho, Capitão Francisco Olinto de Carvalho, Capitão João Olinto de Carvalho e por hora, sob minhas ordens haverá de honrar condignamente a história de minha família. Pois, desde 1724 mantêm o comando vitalício do Fortim do Pinhão de Vera Cruz..." - Foi assim que o Coronel José Antonio Vieira de Carvalho dirigiu-se aos seus subordinados quando assumiu em 1810, e o comandou soberbamente até 1833.
O avô era jovem ainda e jamais esquecera a altivez do Coronel, homem influente na Vila de Santos. Comerciante de fortuna, fora ainda juiz e vereador. O homem de tão obstinado por se tornar Coronel de Milícias e comandar uma fortificação, ofereceu-se em construir, por sua conta, sem soldo algum, um Forte na Ilha Barnabé, proposta rejeitada pelas autoridades. Todavia, antes teve oportunidade de comandar o Forte de São Felipe ao norte da Ilha de Santo Amaro.
O FORTE DE ITAPEMA/SP [1902].

Um acontecido dito à boca pequena, mas que ninguém atrevia-se a conversar com o Coronel Vieira de Carvalho, era o atribulado casamento da filha, Maria Zeferina... Deu num fuzuê! Enamorou-se a rapariga de Manoel Joaquim Soares, Cirurgião-mor do Hospital Militar da Vila de Santos, porém a mãe, espôsa do Coronel, opunha-se intransigente ao casório. O casal resolveu unir-se matrimonialmente a qualquer custo, e na noite de 16 de Julho de 1824, fugidos numa embarcação navegaram para Jurubatuba, onde havia a Capela de São José, sendo casados pelo Padre Francisco Luís da Cunha Peixoto. Inconformada com aquele disparate de Maria Zeferina, a mãe incumbiu o cadete Carlos Augusto Nogueira da Gama e mais três escravos, que renderam o noivo com pistolas ao peito e fizeram o casal retornar à força. Como o documento do casamento na confusão extraviou-se o caso for parar no foro, onde o processo se arrastou durante 15 anos...
PANORÂMICA DA VILA DE SANTOS A PARTIR DE ITAPEMA/SP, NA MARGEM ESQUERDA.

Nem por isso o Coronel Vieira de Carvalho descuidava do Forte de Itapema. Com que esmero cuidava-se das 4 peças de artilharia calibre 12 e das outras 4 calibre 8. Lembrava bem o avô da prontidão no Forte quando da Independência do Brasil, mobilizando uma guarnição formada por 1 oficial, 2 inferiores, 8 artilheiros, 24 serventes-artilheiros e 20 soldados de infantaria à espera de uma invasão da Coroa Portuguesa. A cadeia subterrânea fora reformada a fim de trancafiar sodados insurgentes e invasores. O orgulho por fazer romper a salva de tiros de canhão no momento que o navio de D. Pedro I adentrou o Porto para uma inspeção às Fortalezas.
À ESQUERDA O FORTE DE ITAPEMA, DETALHE DA PINTURA DE BENEDITO CALIXTO.

Quando alguns soldados do Regimento dos Fortes revoltaram-se em 1821 devido ao constante atraso nos soldos, o clima esquentou entre soldados brasileiros da terra e militares portugueses já que estes eram beneficiados pela Coroa Portuguesa. Houve assassinatos e saques na Vila de Santos. Foram mobilizadas tropas de São Paulo, a Corveta Real fundeada no Largo de Santa Rita disparou tiros de advertência aos revoltosos antes da invasão da vila fronteiriça ao Forte. Dias após o Conselho de Guerra, lá adiante, junto a Bocaina podia se ver balançarem os corpos de líderes dos rebeldes enforcados nas vergas do navio e outros que abarrotavam a cadeia do Forte. O avô falava disto com certa emoção, pois eram soldados da terra como ele... Seu pai mesmo presenciara a tristeza do velho ao retirarem em 1850 o último canhão.

Lá se iam tantos anos, desde os primeiros galeões e cargueiros. Com muito custo a Companhia Docas [detalhe da imagem acima] entregara o primeiro trecho de cais moderno naquele ano de 1893... Anos antes, devido ao mal armazenamento de pólvora no paiol, um incêndio consumira a instalações do Forte itapemense.



[ ao lado, o vapor inglês Nasmith.]
 O FORTE DE ITAPEMA, BANHADO PELAS ÁGUAS DE "GUARAPIÇUMÃ", NOME INDÍGENA DO ESTUÁRIO DO PORTO [DÉCADA DE 1910].

Acostumara-se, abandonavam o Forte mas este sempre resistia e ressurgia sobre as rochas do pinhão. E nesta grande ocasião em que o vapor inglês Nasmith singrava rumo ao Valongo, o Forte de Itapema não poderia se fazer ausente. Postado solenemente sobre o barbete junto às ameias, vestido no antigo uniforme de infantaria, ele saudou o navio com salvas de mosquete do avô.
Permaneceu a espiar emocionado até que os lampiões de gás ao sopé do  Monte Serrate ponteassem a noite do lado de lá .

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